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segunda-feira, 9 de julho de 2012



"As mortes acontecem quando a mulher decide terminar"





A promotora de Justiça Lindinalva Rodrigues Dalla Costa, titular da 15 a Vara da Violência Doméstica de Cuiabá, foi a primeira promotora a aplicar a Lei Maria da Penha no Brasil. 


Neste ano de 2012, ela foi reconhecida pelo Governo Federal para integrar a lista “Elas fazem a diferença”, sessão criada no "Portal Brasil". Ela atribuiu a conquista como um mérito para todas as mulheres matogrossenses. Confira AQUI. 


Atuando em casos polêmicos, que envolvem agressões e assassinatos de mulheres, Lindinalva afirma que, geralmente, esses crimes ocorrem no ambiente familiar. 
Além de atuar no Ministério Público Estadual (MPE), a promotoria ocupa cargos importantes na luta contra a violência doméstica. 
Lindinalva é Coordenadora Nacional da Copevid – Comissão Permanente de Enfrentamento à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; representa o MPE em uma campanha nacional, que vai ser lançada em 7 de agosto, chamada "Compromisso e Atitude", onde vários operadores de Direito – defensoria pública, governo, união e judiciário - irão participar . 


Autora de vários livros e cartilhas sobre os direitos das mulheres e combate a violência doméstica, Lindinalva relatou a situação da violência doméstica no Brasil. 


Leia os principais trechos da entrevista: 


MidiaNews – Como a violência doméstica pode ser combatida na sociedade? 


Lindinalda Dalla Costa: A violência doméstica não pode ser combatida somente aqui, nos processos, a golpe de lei, temos uma problemática cultural que advém desse processo de machismo, comportamento e temos que trabalhar nessa questão. Os promotores de justiça devem atuar em trabalhos extras. Porque promotor fazer audiência é a obrigação. Somos muito bem pagos para fazer isso. Quando fazemos além do dever funcional, com projetos sociais, temos o reconhecimento. Eu fico muito feliz em ter recebido do Governo Federal uma condecoração como uma das 25 mulheres mais atuantes no Brasil, ao lado de mulheres como a Irmã Dulce e Fernanda Montenegro. A única mulher da área jurídica, nenhuma juíza, nem ministra, apenas eu, como uma simples promotora de justiça de Mato Grosso, que é um Estado inexpressível a nível nacional. Essa foi uma conquista para todas nós mulheres matogrossenses aparecermos na lista das Mulheres que Fazem a Diferença no Brasil. 
MidiaNews – Existem fatores em nossa sociedade que contribuem para que a violência seja vista como um evento natural na vida?
Lindinalda Dalla Costa: A violência doméstica é tão naturalizada que é aceita. As mulheres têm um verdadeiro pavor de viverem sozinhas e acabam aceitando todo tipo de situação. Aceitam qualquer coisa. Nós somos criadas para acreditar que precisamos de complemento, aí a mulher chega a uma idade, sem ter se casado, se sente encalhada, mal amada, aí acaba se rendendo para qualquer homem que aparece. 


Criamos as nossas filhas e filhos com esse pensamento, de vida em par. A menina, desde pequeninha, já tem esse pensamento. Nas brincadeiras de princesas, tem a coroinha, o vestido branco e longo, o castelo, o príncipe no cavalo branco. As mulheres esperam 20, 30, 40 anos, a vida inteira esperando. E esse príncipe não vem. 


Aí, quando casam, o que a mulher tem que fazer? Tem que se sacrificar para manter a vida a dois, para salvar o casamento. Então, o que a gente vê, nessas histórias de violência doméstica, são mulheres que foram criadas dessa forma. E que não conseguem se libertar desses conceitos e sofrem a violência. Elas fazem um grande sacrifício para manter o casamento, mesmo com uma vida violenta, onde já terminou o amor, o afeto, o respeito... E elas continuam ali, tentando manter a vida. 


MidiaNews – Qual o participação das famílias nesse histórico de agressões?


Lindinalda Dalla Costa: A aceitação da violência acontece, em grande parte dos casos, pela cobrança do conceito de vida familiar. As mulheres colocam essa ilusão na cabeça e acreditam que só dessa forma podem viver. E quando não conseguem manter o lar em harmonia acreditam que a culpa é delas e carregam um sentimento de fracasso. Aí aguentam também os tapas, os abusos, o controle e muitas vezes elas perdem a vida. 


MidiaNews – Quando a relação chega ao ponto de causar a morte da mulher? 


Lindinalda Dalla Costa: Quando o homem vê que está perdendo o controle, que ele não consegue mais dominar, e nem segurar a mulher pela força, ou pela autoridade, pela violência, ele mata. Em 77% dos casos de homicídios aconteceram quando a mulher decidiu terminar a relação. Quando ela percebeu que não queria mais, deixou de acreditar na promessa de amor eterno. Ai o homem, inconformado, mata a companheira.
MidiaNews – Onde a violência doméstica é mais frequente? Existe uma divisão de classes?
Lindinalda Dalla Costa: Esse tipo de violência pode acontecer comigo, com você, com nossas filhas, amigas, irmãs, sobrinhas. A violência doméstica não tem a ver com classe social, tem a ver com posse, com a forma de criação, machismo. Temos que aprender a nos colocar no lugar na vítima, aí vamos dar importância. Se pensarmos que a violência acontece só nas periferias estamos muito enganados. 


A violência doméstica acontece de forma linear em todas as camadas sociais. Ocorre que, as mulheres de classes menos abastadas tem menos a perder, então elas abrem boca e divulgam. As outras não, elas sofrem bem mais porque tem vergonha de se expor. 


Além do medo, que as outras mulheres também têm, ela tem aquele pensamento, o que os outros vão dizer? 


MidiaNews –A senhora já sofreu algum tipo de violência? 


Lindinalda Dalla Costa: Violência física nunca sofri. Mas já sofri violência psicológica, de ouvir que eu era uma pessoa de gênio difícil, e que se largasse de mim eu terminaria meus dias sozinha.


Ouvi isso por muito tempo e estava acreditando. Quando decidi me separar já estava preparada para a solidão eterna (risos), mas não foi isso que aconteceu, logo depois conheci outra pessoa, estamos casados e muito felizes. 


MidiaNews – Como é tratada a violência em classes abastadas financeiramente? 


Lindinalda Dalla Costa: Fiz uma audiência de uma mulher de classe abastada, que o homem simplesmente arrancou o olho direito dela. E ela veio sofrendo, sofrendo por anos. E mesmo com a violência ela continuou com ele. Depois que ele bateu nela novamente, muitos anos depois, ela resolveu se separar. Mas a gente vê a pessoa tentando salvar o casamento a qualquer custo.
E isso foi em uma pessoa de classe abastada, tanto que essa lesão não foi nem registrada na Polícia, foi tratada em hospitais particulares, como se fosse uma queda, um machucado qualquer. Ela usa uma prótese no olho até hoje.


A mulher da classe mais alta joga a violência para debaixo do tapete. Mas não quer dizer que ela não sofre violência. Ela tem medo de perder a casa, os bens, o status social, o padrão de vida. Aí, essa mulher passa a viver um mundo de mentiras, mostrando para a sociedade o que ela quer ver. E quem olha, acha que é uma pessoa feliz. 


MidiaNews – Grandes tragédias acontecem dentro de casa. Existe uma explicação para isso? 


Lindinalda Dalla Costa: As piores tragédias acontecem dentro de casa. Porque o ser humano usa máscaras. A gente mostra no trabalho, na rua, aquilo que as pessoas querem ver. Mas quando se chega em casa as máscaras caem. Se baixa a guarda e você passa a ser você mesmo. Por isso que em casa acorrem tantas atrocidades. 


Por isso que aquele austríaco, economista renomado, manteve a filha presa no porão por mais de 20 anos e teve seis filhos com ela. Quem que haveria de dizer que aquele ótimo profissional seria um monstro cruel dentro de casa? 


Então, há uma grande diferença no padrão social que a pessoa mostra fora de casa, e o que ela é na realidade. As convenções sociais acabam simulando e dissimulando muita coisa, é em casa que se perde a paciência. 


MidiaNews – O preconceito pela ascensão da mulher reflete no comportamento masculino? 


Lindinalda Dalla Costa: Reflete e muito. Um homem pode ser super preconceituoso com a ascensão da mulher no mercado de trabalho, mas ele tem uma chefe mulher; e ele não vai lá e agride a chefe. Mas, ele chega em casa e desconta toda a raiva na esposa. Há uma relação de poder velada onde há violência. Ele se acha mais importante, mais forte e poderoso, tanto que pode até bater na mulher, humilhá-la e para manter o domínio.
MidiaNews – O uso do corpo da mulher, como objeto sexual, possui relação com a violência? 


Lindinalda Dalla Costa: O Brasil acostumou a "coisificar" as mulheres, é a "coisificação" do ser humano. As mulheres são endeusadas pelo corpo; apreciadas ou não pelo corpo. Aí são vistas como uma propriedade do homem. Na televisão, usa-se o corpo da mulher para vender de tudo. Desde celular, carro, cerveja... Sempre dão um jeito de colocar uma mulher pelada, ou pouco vestida, no meio das propagandas. 


Então há essa coisificação da mulher. Isso em um país extremamente racista, que não diz que é racista. E machista também, mas que não admite. Acontece que, na violência doméstica, nós temos esses dados estatísticos registrados, que não mentem. Aí não tem como esconder, porque vêm os homicídios. 


MidiaNews – Onde o Brasil aparece no ranking de violência contra as mulheres? 


Lindinalda Dalla Costa: O Brasil aparece como sétimo país do mundo com maior número de mulheres assassinadas, uma taxa de 4,4% para cada 100 mil habitantes. Perdemos até para o Casaquistão e para os países árabes, que mutilam as mulheres. A Idade Média, para as mulheres brasileiras, é hoje. 


http://www.jcorreio.com.br/index/noticias/cat-174/id-4021/_as_mortes_acontecem_quando_a_mulher_decide_terminar_



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